31 outubro 2011

MINHA ENTREVISTA AO SITE TERRITÓRIO GONÇALENSE

Nesse dia 31 de Outubro, aniversário da Reforma Protestante, o excelente site Território Gonçalense publicou uma entrevista comigo, na qual versei sobre temas como o papel da igreja na sociedade, religião e política, homossexualismo, intolerância religiosa, blogs evangélicos apologéticos e a minha missão como pastor em São Gonçalo, segundo maior município do Rio de Janeiro.

Sou muito grato a Deus por esta oportunidade e ao Vagner, editor do Território Gonçalense, que foi seu instrumento para que minha entrevista alcance pessoas de diferentes credos, uma vez que seu site não é evangélico.

Confiram a entrevista na íntegra, lembrando que estou pronto para responder atenciosamente a qualquer comentário, os quais também podem ser feitos no site que me entrevistou.

Entrevista com Alan Capriles, o pastor reformista de SG

Não poderia haver data mais adequada do que hoje – Dia da Reforma Protestante – para o TG publicar a entrevista com Alan Capriles, o pastor que tem como missão despertar os evangélicos gonçalenses para o verdadeiro evangelho de Cristo.

Autor do polêmico artigo "A cidade mais evangélica do mundo... e daí?", em que crítica a qualidade espiritual dos protestantes de São Gonçalo, e que segundo uma pesquisa, é o lugar onde tem mais evangélicos por metro quadrado no mundo, Capriles, no entanto, não se envaidece com esse dado. “Que diferença isso trouxe para essa sociedade? Pelo menos, desde que moro aqui, não vi nenhuma diferença.”, questiona em seu brilhante texto.

Casado com Rosa Lúcia, com quem tem dois filhos (Filippe e Gabriel), esse paulistano, que há 10 anos está a frente do ministério da Igreja Bíblica Cristã, localizada em Laranjal, revela que Deus tem um propósito para ele estar aqui:

“O povo dessa cidade necessita urgentemente do evangelho da graça de Deus, a começar pelos próprios evangélicos”.

Pois bem. Vamos então conhecer agora o pensamento desse líder religioso que defende ardorosamente a volta da igreja ao rumo correto...

Vagner Rosa: O senhor nasceu em berço evangélico?

Pastor Alan Capriles: Não. Como grande parte dos brasileiros, meus pais se diziam católicos, mas não eram praticantes. Meu primeiro contato com a igreja evangélica só aconteceu no final da adolescência.

Vagner: Como aconteceu o chamado de Deus para ser pastor?

Pastor Alan: Foi realmente um chamado de Deus. Ocorreu aos 18 anos, quando eu era recém convertido e congregava na Igreja de Nova Vida em Botafogo. Sei que é difícil de acreditar, mas minha vocação pastoral foi confirmada pela experiência de ouvir, literalmente, o Senhor me chamar pelo nome. Mas essa é uma longa história...

Vagner: E o chamado para ser pastor em São Gonçalo? Já conhecia a cidade antes?

Pastor Alan: Conheci São Gonçalo primeiramente a trabalho, como representante de uma gravadora evangélica. Mas a mudança definitiva veio pouco depois, também como resposta de uma oração. Minha esposa Rosa e eu queríamos fazer mais pelo evangelho e então roguei a Deus que nos enviasse para onde fôssemos mais necessários. O ano era 1998 e morávamos em Pedra de Guaratiba, zona oeste do Rio de Janeiro. A resposta veio poucos dias depois, quando um pastor convidou-me para auxiliar seu ministério em São Gonçalo. Como a distância era grande, tivemos de deixar o Rio e passar alguns apertos por amor ao evangelho, como morar numa sala da igreja matriz com nosso pequeno filho até conseguirmos alugar uma casa. A ordenação pastoral ocorreu cerca de dois anos depois.

Vagner: Depois de 13 anos morando aqui, o senhor já se considera um gonçalense ou ainda se sente um paulistano da gema?

Pastor Alan: Para ser franco, nunca me considerei um paulistano da gema. Meu pai viajava muito a trabalho e pouco depois do meu nascimento já estávamos de mudança para outra cidade do Brasil. Somente na minha adolescência foi que passamos a morar definitivamente no bairro de Botafogo, Rio de Janeiro. Mas, após 13 anos morando aqui, o que posso dizer é que amo o povo dessa cidade. Em geral, são pessoas amistosas, solidárias e interessadas em Deus. Fico feliz por meu filho caçula ter nascido aqui. Mas o que sinto mesmo em relação a São Gonçalo é que estou cumprindo uma missão nesta cidade, ou seja, que Deus tem um propósito para eu estar aqui.

Vagner: O seu polêmico artigo “A cidade mais evangélica do mundo...e daí?” deixou a comunidade evangélica de São Gonçalo numa situação nada confortável. O senhor revelou que a qualidade espiritual na maioria das igrejas gonçalenses é baixíssima. Como é a sua relação com os líderes religiosos da cidade?

Pastor Alan: Não foi minha intenção deixar os evangélicos de São Gonçalo em desconforto. Escrevi o referido artigo apenas a fim de despertar os leitores de meu blog para esta realidade. O que eu não imaginava é que ele seria destaque em primeira página de jornal, como aconteceu no Família Cristã, ou que seria reproduzido em outros blogs e sites, muito mais influentes que o meu, como foi o caso do Território Gonçalense. Mas, até o presente momento, tenho mantido uma ótima relação com os líderes evangélicos daqui, até porque eles sabem que tudo quanto está dito naquele artigo é a pura realidade. Grande parte da igreja evangélica, não somente nesta cidade, mas em todo o Brasil, não está cumprindo eficazmente a missão de formar genuínos discípulos de Cristo, razão pela qual não estamos fazendo muita diferença na transformação de nossa sociedade.

Vagner: Como se chegou a conclusão que São Gonçalo é a cidade mais evangélica do mundo? Existe uma pesquisa que confirme esse dado ou é apenas uma hipótese baseada no número excessivo de igrejas existentes em nosso município?

Pastor Alan: Teremos a confirmação desses números em fevereiro de 2012, quando o IBGE divulgar os resultados religiosos do Censo 2010. Por enquanto, o que temos são projeções. Por exemplo, baseado no último crescimento registrado do IBGE, entre 1991 e 2000, que foi de 7,82% ao ano em São Gonçalo, em 2011 os evangélicos já seriam a maioria nessa cidade, chegando a 57,74% da população. Agora só precisamos aguardar a confirmação destes números, pois a grande quantidade de igrejas que surgiram por aqui nos últimos anos parece confirmá-los. Estes dados que passei e outros mais estão disponíveis no site de pesquisas da Sepal.

Vagner: “Feliz a nação cujo Deus é o Senhor”, escreveu o salmista Davi (Salmos 33:12). A julgar pela quantidade de templos cristãos instalados em nossa cidade era para São Gonçalo então ser uma benção, mas segundo o senhor, não é essa a nossa realidade. Como ministro da Palavra de Deus, imagino que deva ser frustrante para o senhor constatar que a observação de Davi não se aplica a nossa realidade, não?

Pastor Alan: Frustrante, porque confirma o fato de que ser evangélico não significa necessariamente ser um cristão genuíno. Uma coisa é ser discípulo de Cristo, outra, muito diferente, é ser discípulo de cristianismo. O que percebo é que existem muitos discípulos de cristianismo, mas poucos discípulos de Cristo. Não basta apenas dizer que Jesus é o Senhor dessa nação, é preciso submeter-se ao seu senhorio. Mas poucos estão realmente dispostos a isso. Somente quando a maioria dos brasileiros estiver praticando os ensinamentos de Jesus é que nossa nação será realmente feliz.

Vagner: Em seu texto o senhor afirma que a maioria dos cultos em São Gonçalo é voltado para o homem e não para Deus. E que as igrejas daqui disputam os membros, tal como as lojas disputam a clientela. Mas essa também não tem sido a realidade, quase que geral, da igreja evangélica brasileira?

Pastor Alan: Sim, é o que me parece. Como escrevi em outro artigo, São Gonçalo serve apenas como exemplo do que mudará em nosso país quando a maioria dos brasileiros for evangélica, ou seja: quase nada. A menos que os evangélicos voltem a pregar o verdadeiro evangelho pregado por Cristo e pelos apóstolos, o qual é muito diferente da pregação materialista e egocêntrica que tem predominado nos púlpitos.

Vagner: Pastor, diante da crescente secularização, do mercantilismo exacerbado, do aumento da idolatria e do sincretismo de crenças pagãs, fatos esses cada vez mais presentes no meio evangélico, a igreja ainda tem autoridade para criticar o “mundo” e apontar os defeitos dos outros?

Pastor Alan: Não é nossa missão criticar o mundo e apontar os defeitos dos outros. Fazer isso é um equívoco. A missão da igreja é alertar o mundo de sua iminente condenação ao inferno e apontar Jesus Cristo como único salvador e mediador entre Deus e os homens, a fim de que sejamos salvos e transformados, para vivermos em amor, segundo a sua vontade. Mas, lamentavelmente, grande parte da igreja evangélica está se deixando influenciar pelo que foi mencionado na pergunta, o que a fez desviar-se de seu propósito.

Vagner: Uma nova tendência evangélica vem sendo observada há algum tempo. Segundo uma pesquisa do IBGE, publicada pela Folha de São Paulo, a proporção de fiéis sem ligação direta com denominações foi de 4% para 14%, de 2003 a 2009. Um salto de 4 milhões de pessoas. Na sua opinião, as igrejas midiáticas são responsáveis por esse comportamento descompromissado de uma parcela dos evangélicos contemporâneos?

Pastor Alan: Em parte, sim. É o chamado fenômeno dos “desigrejados”. Mas não que os evangélicos estejam trocando suas igrejas pelos pregadores da TV. Na realidade, o aumento do número de crentes desigrejados é conseqüência direta da perda de fidelidade da igreja para com o verdadeiro evangelho. Apesar de não existir igreja perfeita, a igreja evangélica atual tornou-se insuportável para cristãos amadurecidos, que não concordam que o culto seja um show, que o altar seja um palco, que o pastor seja um animador de auditório, ou que o púlpito seja um balcão de negócios. Mas, como a maioria das igrejas que estão na mídia são assim, elas têm sua parcela de culpa nisso; além de ser má influência para outras igrejas, as igrejas midiáticas ainda propagam a ideia de que todas as demais igrejas evangélicas sejam como elas, o que não é verdade. Ou seja: ao invés das pessoas deixarem de ir à igreja para assistir programas evangélicos na TV, esses programas estão afastando da igreja as pessoas que estão em busca de crescimento espiritual, mas que viram suas igrejas se transformarem no modelo de igreja apresentado na mídia. Isso tem ocorrido muito. Tenho contato com vários evangélicos que passaram por isso e agora estão tentando buscar a Deus por conta própria.

Vagner: Diante dessa complexidade e de outros desafios que a doutrina cristã evangélica vem enfrentando, qual será o futuro da igreja e que papel ela deve exercer hoje na sociedade?

Pastor Alan: Há um único caminho para que a igreja evangélica se salve: voltar a pregar o genuíno evangelho. A pregação é o leme que conduz a igreja. Se os pregadores voltarem a pregar o que as pessoas precisam ouvir para serem salvas, transformadas, e não o que elas gostariam de ouvir para serem prósperas, teremos uma igreja forte, que causará impacto positivo na sociedade. Do contrário, o futuro da igreja evangélica poderá ser sombrio, com cada vez mais escândalos e fragmentações, até que por fim se extinguirá. Jesus mesmo disse que “um reino dividido contra si mesmo não poderá subsistir”. Mas não creio que tenhamos esse fim. É cada vez maior a reação dentro do próprio meio evangélico e tenho certeza de que esse mover é algo da parte de Deus. E, agindo Deus, quem impedirá?

Vagner: E no campo político, como deve se posicionar?

Pastor Alan: Não podemos esquecer que a igreja é formada por pessoas, pessoas que, supostamente, são convertidas a Cristo. Portanto, cada cristão deve se posicionar politicamente segundo os ensinamentos de Jesus Cristo, e não segundo os interesses de qualquer denominação evangélica. Por exemplo, eu não devo votar em alguém apenas porque tal candidato é de minha denominação, mas preciso analisar se ele tem capacidade para resolver as demandas do cargo e se é o melhor para nossa nação. Do contrário, podemos estar elegendo alguém que não fará bem ao próximo, contrariando o que Jesus nos ensinou. Aproveito para esclarecer que a candidatura de pastores ou bispos a qualquer cargo político é um equívoco, pois se trata de uma traição ao seu chamado ministerial. Um pastor que não conseguiu se manter fiel ao chamado de Deus em sua vida jamais se manterá fiel ao povo brasileiro. Mas sou favorável à candidatura de qualquer cristão que não seja pastor.

Vagner: Recentemente, numa entrevista a revista Época, o polêmico pastor Silas Malafaia disse que todo governante agora terá de dizer em que princípios acredita. O senhor não acha que as questões religiosas estão se tornando intransigentes demais num Estado laico? Que os evangélicos deveriam se preocupar mais em combater a corrupção, exigir mais investimentos nas áreas da saúde, educação, segurança pública, empregos e transportes do que ficar discutindo a observação das doutrinas da igreja?

Pastor Alan: Com certeza, não somente os evangélicos, mas todo cidadão deve exigir o fim da corrupção e suas conseqüências. Quanto em separar a política das questões religiosas, penso que isso seja difícil por pelo menos dois motivos: primeiro, porque a política é feita por pessoas e para pessoas – e estas, geralmente, têm alguma religião; segundo, porque as questões polêmicas nem sempre são apenas religiosas, mas também de ordem moral, o que vai muito além do âmbito religioso. Neste sentido, não somente os pastores, mas qualquer pessoa influente deveria se sentir no dever de alertar os cidadãos acerca de qualquer candidato que defenda princípios imorais, que ameacem o bem estar de nossa sociedade. No entanto, considero sim um equívoco discutir a observação de doutrinas da igreja na política. Mas, devo enfatizar, questões morais podem ser facilmente confundidas com doutrinas religiosas.

Vagner: Outro pastor que sempre causa polêmica com seus posicionamentos teológicos e seculares é o Ricardo Gondim. Uma declaração dele defendendo a regulamentação de uniões homoafetivas no Brasil causou muito bochicho no meio evangélico. Numa entrevista ao jornal O Povo, de Fortaleza, o assembleiano explicou o seu pensamento: “Não é uma questão de pensamento. É uma questão de lógica e eu repito o que disse. Em um estado laico, a lei não pode marginalizar ou distinguir homens ou mulheres que declarem homoafetivos. Há que se entender que num estado laico não podemos confundir teologia, convicções pessoais, com ordenamento de leis de um país. Não podemos impor preceitos religiosos para toda a sociedade civil. Se os preceitos são meus, você tem o direito de não adotá-los. Foi assim que me posicionei sobre essa questão do STF, que a meu ver, agiu corretamente garantindo o direito de um segmento de nossa sociedade”, disse. O senhor concorda com a visão de Gondim ou acha também que ele se tornou um herege, como alguns pastores o classificam?

Pastor Alan: Não considero o Ricardo Gondim um herege. Para ser um herege ele precisaria ter negado a Jesus como único Senhor e Salvador, o que não foi o caso. Mas, por outro lado, não concordo com essa visão de Gondim. O fato de o estado ser laico não significa que tenhamos que concordar com todas as suas decisões. E, particularmente, não concordo com a regulamentação de uniões homoafetivas. Primeiro, porque se trata de uma questão moral, que ultrapassa o âmbito religioso. Não é somente um preceito desta ou daquela religião, como afirmou Gondim, de maneira que ninguém precisa ser evangélico, ou católico, para discordar da prática homossexual. No entanto, qualquer tipo de ofensa ou violência contra homossexuais é totalmente inaceitável. As pessoas são livres para viver do jeito que bem entenderem, assim como somos livres para discordar de qualquer decisão imposta pelo governo.

Vagner: Outro assunto controverso é a questão do aborto. As feministas afirmam que nenhuma mulher defende o aborto como método contraceptivo, pois considera também essa uma forma violenta, mas, sim, uma legalização da prática como um trabalho de sustentação aos direitos reprodutivos e sexuais da mulher. Qual é a posição do senhor sobre a descriminalização do aborto?

Pastor Alan: O aborto é outra questão que ultrapassa o âmbito religioso. A ciência e a consciência já são suficientes para definir minha posição. Se, por um lado, a ciência nos mostra que o feto não é extensão do corpo da mulher, mas que já é um ser humano, que reside temporariamente no útero de sua mãe; por outro, nossa própria consciência atesta que tirar a vida de um ser humano inocente é um crime. Ora, o feto é um ser humano inocente. Portanto, independente de questões religiosas, sou contra a descriminalização do aborto.

Vagner: Voltando a entrevista da Época, o Malafaia também observou que o governante terá que botar a cara “porque a comunidade evangélica está bem esperta, madura. Não vai dar para ficar em cima do muro”. O senhor acha que a comunidade evangélica está mesmo madura politicamente? Pois o que se observa por aí é que tem muita gente ainda seguindo a opinião de seus líderes sem nenhum senso crítico...

Pastor Alan: Não creio que a comunidade evangélica esteja madura politicamente. Mas a falta de senso crítico não é um problema existente apenas no meio evangélico. Grande parte do povo brasileiro ainda não aprendeu a votar. Portanto, esse é um problema generalizado, que ocorre tanto dentro quanto fora da igreja.

Vagner: Já presenciei alguns pastores utilizando-se de textos bíblicos para influenciar os fiéis a favor de seus candidatos (acordos políticos). As passagens mais usadas são: “Toda alma esteja sujeita às autoridades superiores; porque não há autoridade que não venha de Deus; e as que existem foram ordenadas por Deus. Por isso quem resiste à autoridade resiste à ordenação de Deus; e os que resistem trarão sobre si a mesma condenação.” (Romanos 13:1,2) e “Adverte-lhes que estejam sujeitos aos governadores e autoridades, que sejam obedientes, e estejam preparados para toda boa obra, que ninguém infamem, nem sejam contenciosos, mas moderados, mostrando toda a mansidão para com todos os homens.” (Tito 3:1,2). Como vê essas manipulações políticas com a Palavra de Deus e como trata as questões políticas com os membros de sua igreja?

Pastor Alan: Usar a Palavra de Deus para fazer chantagem política é algo abominável. Em nossa igreja procuro deixar claro que cada um deve votar conscientemente, analisando o histórico de cada candidato, bem como sua capacidade para exercer o cargo a que se propõe. Jamais coagimos ninguém a votar em qualquer candidato, assim como não permitimos que se faça do altar um palanque político. Quanto aos versículos citados, eles não têm qualquer ligação com eleições políticas, mas tratam de obediência a autoridades que existem para manter a ordem pública. Mas, lamentavelmente, alguns impostores, que se dizem pastores, retiram textos de seus contextos, a fim de manipular a decisão dos membros de sua igreja.

Vagner: E quanto a questão da intolerância religiosa, como trata esse assunto? O que achou da polêmica envolvendo a demolição do imóvel que sediou o primeiro centro de umbanda do país, localizado aqui em São Gonçalo?

Pastor Alan: A intolerância religiosa é totalmente improdutiva. Ninguém se converte a Cristo porque foi maltratado por um cristão. Como eu disse antes, uma coisa é ser discípulo de cristianismo, outra, muito diferente, é ser discípulo de Cristo. Discípulos de cristianismo se esforçam por defender as doutrinas de sua denominação cristã, até mesmo com ofensas e injúrias contra seus próprios irmãos. Discípulos de Cristo preferem se esforçar na prática daquilo que Jesus ensinou, sobretudo em amar ao próximo como ele nos amou, tratando seu semelhante da mesma forma como gostariam de ser tratados. Quanto à demolição daquele imóvel, penso que os evangélicos não devem se envolver nesta questão, pois derrubar tijolos não fará ninguém deixar a umbanda.

Vagner: Falando agora de uma outra polêmica: é sabido que os blogs apologéticos vêm incomodando muita gente no meio evangélico. Há pouco tempo, o pastor Silas Malafaia (ele de novo. rs) chamou todos os blogueiros que o criticam de filhos do diabo. Preocupado com os prejuízos financeiros, as ofertas começaram a minguar pela TV, decidiu então lançar o portal Verdade Gospel, como forma de se defender dos ataques dos irmãozinhos questionadores. O senhor, que também tem um blog, como tem visto essa influência dos blogueiros que defendem a verdade da doutrina cristã? O retorno tem sido positivo? Esses blogs podem contribuir para uma nova reforma da igreja?

Pastor Alan: A igreja não necessita de uma nova reforma, mas de um simples retorno ao evangelho. E, sem dúvida, alguns blogs têm contribuído muito para esse caminho de volta. No entanto, tenho duas coisas a lamentar nesse processo. Primeiro, lamento que alguns blogueiros de linha reformada estejam se aproveitando de nossas falhas para buscar um retorno ao calvinismo, e não simplesmente ao evangelho. A solução para os problemas da igreja evangélica não é Calvino, mas Jesus Cristo. E, segundo, lamento mais ainda os ataques verbais utilizados por certos blogueiros, que se dizem cristãos, mas que contrariam os ensinamentos de Cristo ao valer-se de xingamentos e difamações. Porém, nada disso justifica chamar esses blogueiros de “filhos do diabo”. Jesus nos ensinou a orar pelos que nos perseguem e não a condená-los ao inferno.

Vagner: Há também um movimento pela ética evangélica, que vem promovendo protestos em eventos gospel (principalmente nas marchas para Jesus) e também em frente aos templos suntuosos com faixas que dizem que “O show tem que parar!”. Qual é a sua opinião sobre esse movimento? Apoia o discurso deles?

Pastor Alan: Apoio totalmente. Este é um movimento pacífico, que busca despertar os evangélicos para o verdadeiro evangelho. Até já lhes enviei um e-mail, pedindo que me comuniquem quando houver algum protesto em São Gonçalo, pois também quero vestir essa camisa. Jesus deixou bem claro que “a vida de um homem não consiste na abundância dos bens que ele possui”, mas esse tipo de mensagem é omitida por muitos pastores, uma vez que contraria a teologia da prosperidade adotada por eles. Isso já foi longe demais. Com certeza, esse $how tem que parar!

Vagner: A sua denominação chama-se Igreja Bíblica Cristã. Com esse sugestivo nome, imagino que a congregação deva dar bastante atenção ao estudo da Bíblia, não? Fale um pouco do ministério de sua igreja.

Pastor Alan: Devo confessar que nem sempre fui cuidadoso em conduzir nossa igreja segundo a palavra de Deus. Apesar do sugestivo nome, cometi quase todos os erros que hoje aponto existir na igreja. Somente de três anos pra cá fui despertado para o fato de que o modelo de igreja vigente não é bíblico e nem cristão. Desde então tenho procurado transmitir essa verdade a todos que pastoreio, buscando retornar à pureza e simplicidade devidas a Cristo. Não é tarefa fácil, pois hoje muitas pessoas procuram a igreja em busca do “ter” e não mais do “ser”. Mas a obra de Deus não se trata de fazer campanhas, eventos e atividades de entretenimento, mas de se praticar no dia a dia tudo quanto Jesus nos ensinou. A obra de Deus se trata de sermos novas criaturas, que vivam para Sua glória. Sendo assim, nosso ministério se concentra em formar verdadeiros discípulos de Cristo, que sejam reconhecidos por uma fé atuante, a qual se traduz na prática do amor ao próximo. Mas não basta somente o ensino bíblico. É fundamental a prática da oração e o exemplo pastoral, que fala mais alto que qualquer pregação.

Vagner: Em seu elogiado artigo, o senhor comenta que quem prega um evangelho puro e simples nessa cidade, só pode estar mesmo em missão e que a mais dura de todas as missões é evangelizar os próprios evangélicos. Por que é difícil evangelizar os evangélicos? Não deveria ser mais fácil, afinal de contas, eles já conhecem a Bíblia?

Pastor Alan: Os evangélicos que precisam ser evangelizados são aqueles que procuraram a igreja pelos motivos errados. Percebo que estes, atualmente, são a maioria. Se perguntarmos a alguém porque ele foi ao culto, geralmente sua resposta será: “fui buscar minha bênção.” Desta forma, as pessoas buscam a Jesus como a solução para seus problemas e não como a salvação de seus pecados. O culto, na maioria das igrejas, é voltado para os interesses do homem e não para se conhecer a vontade de Deus, que é nos transformar em seus verdadeiros filhos, à semelhança de Jesus Cristo. Trabalhar essa mudança de foco é muito difícil, especialmente quando se trata de evangélicos que passaram a vida inteira ouvindo pregações que enfatizam Jesus como solução para todos os seus problemas. Esse tipo de propaganda consegue resultados numéricos, pois o povo gosta de ouvi-la, mas não é a verdade bíblica. Uma coisa é andar com a Bíblia na mão, outra muito diferente é conhecer seus escritos, principalmente os escritos do Novo Testamento. Por isso a maioria dos evangélicos está sendo enganada, por não conhecer a Bíblia o quanto deveria, a começar pelo evangelho de Cristo. Mas estou certo de que, mais cedo ou mais tarde, a igreja despertará para o verdadeiro evangelho. E sei que contribuir para que isto aconteça é parte da minha missão nesta cidade.

Vagner: Hoje está fazendo 494 anos que o padre Martinho Lutero afixou, na porta da igreja do Castelo de Wittenberg, em 31 de outubro de 1517, as suas 95 teses questionando as práticas inadequadas da Igreja Católica, nas quais resultaram na Reforma Protestante. Analisando o cenário atual da igreja evangélica, certos aspectos não lembram a realidade católica que Lutero condenou na época, como a venda de bençãos (indulgências) e a secularização (paganismo), por exemplo?

Pastor Alan: Lamento dizer que sim. A igreja evangélica distanciou-se muito dos princípios da reforma e, por conta disso, enfrenta uma séria crise de identidade. O pior é que muitos ainda não se deram conta disso. Aliás, muitos pastores nem sequer conhecem aqueles que foram os cinco pilares da reforma: somente a Bíblia, somente Cristo, somente a graça, somente a fé, e somente a Deus seja a glória. O simples retorno a estes princípios bastariam para trazer a igreja de volta ao rumo correto. Escrevi a respeito disso em meu blog, no artigo intitulado “Não precisamos de uma nova reforma, precisamos de um simples retorno”.

Vagner: Por que a data que homenageia a Reforma Protestante (31 de outubro) não é celebrada festivamente pelas igrejas evangélicas brasileiras? Não seria uma oportunidade excelente para promover a reflexão sobre a fé pura e genuína em Jesus Cristo, proposta essa defendida enfaticamente por Lutero?

Pastor Alan: Na verdade, a fé pura e genuína em Jesus Cristo deveria ser pregada e ensinada sempre, não apenas em 31 de Outubro. Se grande parte das igrejas não está fazendo isso no decorrer do ano, como refletir numa data que traria constrangimento e vergonha? Essa é a razão pela qual a maioria das igrejas não pode celebrar festivamente tal data.

Vagner: Pastor Alan, muito obrigado pela sua entrevista! Que o senhor seja vitorioso em seu trabalho evangelístico e que a nossa cidade possa ser verdadeiramente abençoada!

Pastor Alan: Eu é que agradeço pela oportunidade. E peço a Deus que abençoe cada dia mais sua vida e o Território Gonçalense, a fim de que este site continue sendo um canal de bênção para o povo de nossa cidade. E a Deus seja a glória!

Vagner: Amém!

Pastor Alan com a esposa Rosa e os filhos Gabriel e Filippe

03 outubro 2011

IGREJADOS, DESIGREJADOS E O QUE REALMENTE IMPORTA


Compartilho com os leitores deste blog uma edificante troca de comentários a respeito da questão dos “desigrejados”. Particularmente, considero o termo “desigrejado” um tanto inadequado. No entanto, reconheço que é desta forma que são chamados aqueles que, apesar de terem deixado sua denominação cristã, não se consideram desviados de Cristo.

A troca de comentários está originalmente publicada no excelente blog do Maurício Zágari e começou por causa de uma frase escrita na conclusão de uma de suas postagens. Discordei de sua posição e achei necessário expor minha opinião no espaço destinado aos comentários.

Segue-se o que escrevi, o que ele respondeu, minha réplica e sua tréplica. O texto é longo, mas considero que vale a pena ser lido.

Alan Capriles disse:
29/09/2011 às 22:21

Prezado Maurício,
Como o irmão sabe, tenho um blog. O que talvez não saiba é que meu blog é seguido por muitos “desigrejados”, aos quais procuro aconselhar com carinho. Coloquei a palavra entre aspas porque prefiro classificar a maioria deles como “adenominacionais” – uma vez que continuam submissos a Cristo, o cabeça do corpo e permanecem congregando com outros irmãos, ainda que fora de uma denominação. Ou seja, nem todos deixaram de fazer parte da igreja. O conceito do que é igreja é que não podemos perder de vista.

Comento isso porque sei que muitos daqueles que o amado chamou de “desigrejados” não cabem dentro desta sua conclusão, que transcrevo a seguir:

“Por isso os desigrejados me entristecem, porque não tiveram a capacidade de compreender a realidade da congregação dos santos, acharam que o zoológico fedorento seria um parque cheio de animaizinhos saltitantes e felizes. Então no primeiro coice que a zebra leva do camelo ela já quer pular fora.”

Não posso concordar com a sentença acima, por uma simples constatação: ela não expressa a realidade. “Desigrejados” em sua maioria, não são pessoas que “não tiveram a capacidade de compreender a realidade da congregação dos santos”, mas, pelo contrário, geralmente são pessoas que compreenderam o evangelho melhor do que aqueles que estão transformando a igreja num circo e fazendo dos crentes um comércio. São os que acordaram para o fato de que algo não está bem e chegou num ponto insuportável.

Nosso querido bispo Walter McAlister me parece ser um dos que acordou para esta realidade e também tem feito reformas em sua denominação.

Pela misericórdia de Deus, o mesmo ocorreu comigo e também tenho feito reformas na igreja que pastoreio, buscando retirar conceitos errôneos que se instalaram no corpo de Cristo e que precisam ser confrontados com a verdade do evangelho. Isso não é querer uma igreja perfeita, mas somente reconhecer que nossas imperfeições não são desculpa para continuarmos com práticas que idolatram o homem, como pregações voltadas para o que as pessoas querem ouvir e não o que precisam ouvir.

Outro servo de Deus que despertou para esse fato, e que vê os desigrejados como uma consequência de uma igreja infiel, é o reverendo Hernandes Dias Lopes, que tem dezenas de pregações denunciando erros que não podem ser tolerados. Eu poderia citar muitos outros ministros que estão denunciando o mesmo grave problema, como Paul Washer, por exemplo, cujo vídeo foi postado aqui recentemente. A questão é: basta apenas ver o vídeo, ficar chocado e até chorar? Não. É preciso ter a coragem de fazer as mudanças que precisam ser feitas.

O problema é que raramente são pastores que despertam. Quando são os membros de igrejas-circo que despertam para a verdade, fica impossível continuar congregando ali. Repito: impossível. Eles percebem que altar não deve ser palco, que culto não deveria ser show, que pastor não é animador de auditório, que pregação não deveria ser palestra de motivação (entre outras coisas) – e participar de uma reunião onde é só isso que acontece é uma “tortura”. Eu, por exemplo, não consigo mais. Graças a Deus que o Senhor me despertou como pastor, pois, do contrário, eu seria mais um desigrejado. Por uma simples razão: onde moro, todas as igrejas viraram circo, tal qual o modelo que acabei de mencionar. Só pregam o que as pessoas querem ouvir, alisando seus egos, convidam as pessoas a virem a Jesus por interesse de receber bênção, o culto mais parece um show e os membros competem entre si por cargos e lideranças, como se Jesus não tivesse nos proibido claramente de todas essas práticas.

Sendo assim, o que o amado sugere com eles façam? Na maioria das vezes não adianta conversar com o pastor, pois geralmente esse pastor é um impostor, que não está nem aí para o que Jesus ensinou – o que lhe interessa é como fazer com que o próximo culto esteja mais cheio, custe o que custar. Os desigrejados deveriam voltar para as igrejas-circo, ou fazer o quê, na sua opinião? Muitas deles afirmam que oraram, pedindo direção a Deus e a resposta do Senhor foi: “saia desse meio, pois Eu não estou no meio disso.”

Lamentavelmente, são poucas as igrejas que buscam viver na verdade. Não é fácil encontrá-las. Dessa forma, pessoas que querem buscar a Cristo com sinceridade acabam sem ter uma denominação para congregar. Tratar esses irmãos com rispidez não irá trazê-los de volta. Voltarmos ao evangelho é que os trará novamente para perto de nós.

Desculpe se meu comentário foi um desabafo. Não é nada pessoal. Pelo contrário, gosto muito de ler seu blog, só não podia deixar de mencionar aquela frase desse artigo, pois a considero injusta com os desigrejados. Pelo menos, com os que conheço, aos quais amo no Senhor.

Um forte abraço,
no amor do Cristo Jesus.


Mauricio Zágari disse:
30/09/2011 às 10:05
 Amado,
entendi suas intenções ao me escrever, as melhores possíveis.
 Há, porém, algumas considerações. Conheço bem tb a realidade dos desigrejados. Já fiz inclusive uma reportagem sobre eles para a revista Cristianismo Hoje, que pelo Google o irmão encontra fácil na web. Não concordo com o termo “adenominacional”, pq em sua grande maioria detestam a “instituição” igreja. Nem usam esse termo. Falam “comunidades”. São contra liturgias. Contra hierarquias. Contra o dizimo bíblico. E por aí vai. Eu não acredito quando alguém diz que “Deus mandou fulano sair da igreja” mas posso acreditar que Deus os tenha mandado mudar de igreja. Temo muito por esses irmãos que se reúnem em quintais e salas de estar pois, embora estejam ligados à Videira pela fé, em grande parte são liderados por pessoas sem conhecimento bíblico embora haja boas intenções. E como diz a Palavra, “pode um cego guiar outro cego”?
 Não acredito nessa forma de comunhão. Creio em lideranças bem preparadas (se o irmão for ler todos os comentários deixados aqui no blog a respeito do post sobre “O Cristão pode ouvir música do mundo?” por exemplo, terá uma amostragem de pessoas que argumentam com conhecimento e outras que falam os maiores absurdos. Imagine se cada um liderasse um desses grupos, como seria o discipulado do rebanho?Em muitos casos um desastre. Esse é meu medo, pois esses grupos caseiros acabam virando mini-instituições, muitas lideradas por gente que nunca leu a Bíblia inteira, tem uma devocionalidade distorcida e que têm como modelos lideres tenebrosos).
 Sei das igrejas que saíram dos trilhos. Mas não concordo que os que as deixaram vivam esse modelo perigoso. O caminho é buscar outra igreja. Isso dá trabalho? Claro. Mas é o que deve ser feito, pois há os 7 mil que não dobraram seus joelhos a Baal. Há igrejas serias. Há pastores que temem a Deus. Há seiva na igreja institucional. Então em vez de ficar e ajudar a consertar os problemas seremos egoístas e pularemos fora, visando aos nossos próprios interesses? Não vejo isso como Bíblico. Creio em ficar e ajudar a melhorar para que os que ali permanecem sejam edificados. Senão quem cuidará deles?
 Eu trabalho com Bp. Walter, sou o editor de “O fim de uma era” e como tal participo dentro do que está sendo feito (dentro do que me cabe). Tenho o mesmo espírito e quero ver a Igreja saudável.
 Vejo o problema dos desigrejados não como um caminho alternativo, mas como o sintoma de uma doença. E temos de combatê-la. Tratar dos feridos. Mas não deixá-los morando no hospital após o fim do tratamento nem em uma praça: nos os mandamos de volta para casa. Para que eles, por sua vez, cuidem de outros feridos.
 Enfim, é uma discussão longa e complexa. Mas eu creio sim que o desigrejar-se é um equívoco. A igreja onde se está é mal liderada e ensina doutrinas espúrias? Mude-se de igreja. Mas ficar fundando mini-igrejas de fundo de quintal, onde sabe-se Deus como é o ensino e o discipulado, é risco de morte. Se um neopentecostal descobre que sua igreja está desencaminhada o que sugiro nunca é “ah, saia e funde um grupo alternativo”, mas “procure uma igreja histórica, com alicerces de séculos, onde as pessoas no mínimo estudaram a Bíblia”. Creio que esse é o caminho.
 É o que penso. Leia se desejar os posts que escrevi sobre o assunto aqui no APENAS e verá o que penso. “Jesus X Igreja: tornei-me cristão quando saí da igreja”, “Jesus nunca construiu templos”, “Hippies, porcos e a Igreja institucional”. Todos tratam do assunto, que considero grave. Os desigrejados apenas saem de um erro e caem em outro. Pois o problema não são as instituições – é o pecado no coração do homem. Que estará nos templos ou nos quintais e nos seguirá aonde formos.
 A solução não está na debandada, mas na reestruturação. O irmão disse algo importantíssimo:”onde moro, todas as igrejas viraram circo” mas ao mesmo tempo disse “Pela misericórdia de Deus, o mesmo ocorreu comigo e também tenho feito reformas na igreja que pastoreio, buscando retirar conceitos errôneos que se instalaram no corpo de Cristo e que precisam ser confrontados com a verdade do evangelho”. Ou seja: se na igreja que o irmão lidera vive-se um cristianismo reformado, eu diria a qualquer desigrejado da sua região: “não abandone as igrejas e vá viver em pequenas comunidades, mas saia do circo e procure a igreja do Pr. Alan, que tem pregado um Evangelho verdadeiro”. Percebe?
 Novamente: entendo seu espirito e sua preocupação. Compartilho dela. Mas creio que nosso papel é instruir os tais que abandonaram a instituição a quE voltem e não que fiquem por aí, sob a instrução sabe-se lá de quem. Meu medo é por suas almas.
 Te abraço, no amor do Senhor e com carinho fraterno.

Alan Capriles disse:
30/09/2011 às 11:53

Querido irmão em Cristo
Agradeço pela publicação de meu comentário e por sua atenção ao respondê-lo.

Talvez eu não tenha sido bem claro na questão que defendi, por isso acho necessário enfatizá-la aqui:

Nem todos os desigrejados são pessoas “que não tiveram a capacidade de compreender a realidade da congregação dos santos” como foi dito em seu artigo. Achei essa frase muito dura e, para ser franco, preconceituosa.

Você disse que o caminho é buscar outra igreja. Concordo, desde que haja uma igreja fiel ao alcance dessa pessoa, mas isso raramente acontece. É fácil para nós dizermos “busque outra igreja”, pois temos carro e dinheiro para a gasolina. Mas pense nos milhares que não tem condições de pegar ônibus duas ou três vezes na semana para membrar-se numa boa igreja, que pregue a palavra com fidelidade… Essa é a realidade da maioria em nosso país. Sei do que estou falando porque a igreja que pastoreio fica num bairro pobre do município de São Gonçalo, no qual todas as igrejas são muito parecidas, no sentido de que seus cultos são centrados no homem e não em Deus.

Quanto aos desigrejados detestarem a instituição e serem contra liturgias, hierarquias e o dizimo bíblico, a questão é: Por que detestam a instituição? E por que são contra essas práticas? Que tal dialogarmos com eles, ao invés de apenas estranhá-los? Muito do que eles dizem tem fundamento, apesar de alguns estarem indo longe demais, o que admito e lamento.

Mas a verdade, comprovada historicamente, é que essas coisas que os desigrejados combatem (igreja-instituição, liturgias, hierarquias e até o dízimo) começaram a entrar na igreja a partir do imperador Constantino, em 327 d.C. que passou a romanizá-la. Não estou dizendo que a igreja fosse perfeita antes de sua institucionalização, mas precisamos admitir que a igreja viveu muito bem por quase três séculos sem ela. Teve muitos problemas? Teve, mas não mais do que atualmente. Os problemas de hoje são piores, tendo em vista que os cristãos daquela época eram reconhecidos pelo amor ao próximo e por darem a própria vida por amor ao Senhor. Hoje, tem faltado ambas características, na maioria dos que se dizem cristãos. E tem sobrado orgulho denominacional, soberba nos pastores, disputas por cargos e lideranças, investimento em mega templos, etc.

O amado defende liturgias, hierarquias e o dízimo bíblico. Respeito e compreendo perfeitamente sua atitude, pois até três anos atrás eu também defendia tudo isso. Mas a verdade, facilmente comprovada, é que liturgias, hierarquias e até o dízimo bíblico nunca foram ensinados nas epístolas. Os crentes gentios nunca foram instruídos nesse sentido. Mas foram instruídos a ter ordem em suas reuniões (o que é diferente de liturgias) e a obedecerem a palavra de Deus ensinada por seus guias (o que é diferente de hierarquias, pois somos todos iguais abaixo de Deus). Não havia título naquele tempo, havia função (serviço ao próximo, cada qual segundo seu dom). Prova disso é a ausência dessas funções escritas na Bíblia antes do nome de qualquer ministro do evangelho. Não encontramos escrito “apóstolo Pedro”, ou “apóstolo Paulo”, ou “evangelista Filipe” ou “diácono Estêvão”, ou “pastor Timóteo”. A ideia de fazer da função um título só veio após Constantino, que deu cargo e poder político aos que exerciam estas funções. Isso é frontalmente contrário ao que o Senhor Jesus nos ensinou (Mc 10:42-44; Mt 23:8-12) Por favor, não pense que estou querendo lhe ensinar alguma coisa, sei que o irmão é professor de teologia e sabe muito bem de tudo isso. Estou apenas lembrando de fatos que nos ajudam a entender a posição dos desigrejados.

Quanto ao dízimo, já que o irmão tocou no assunto, precisamos falar francamente. Histórica e biblicamente o dízimo nunca foi exigido de um gentio convertido a Cristo. Se o dízimo fosse mandamento de Cristo, com toda certeza Paulo o ensinaria em suas epístolas. Como ele deixaria de ensinar algo tão importante assim? Ele não ensinou isso aos gentios (e nós somos gentios) pela mesma razão que não ensinou sobre a guarda do sábado, ou sobre a veneração a Maria – simplesmente porque não são práticas que os cristãos devam fazer. Por outro lado, Paulo nos ensinou a amar nosso próximo de tal maneira, que venhamos repartir com ele nossos bens e dinheiro, seja para sustentar irmãos que se dediquem à pregação e ao ensino, seja para matar a fome de irmãos em necessidade.

Sou contra o dízimo? Não. Sou a favor da verdade. Se alguém quiser dar apenas 10% de sua renda para uma igreja e acreditar que isso é o bastante, o problema é dessa pessoa. Cada um dará contas de si mesmo a Deus. Prefiro dar muito além disso e ensinar aos irmãos que pastoreio a fazer o mesmo, cada qual segundo o que tiver proposto em seu coração, como nos ensina a palavra de Deus.

Sou contra a instituição igreja? Não. Mas a verdade é que não necessitamos dela para sermos cristãos. Por isso acho injusto considerar todos os desigrejados como pessoas “que não tiveram a capacidade de compreender a realidade da congregação dos santos” como foi dito em seu artigo. E, já que isso não foi consertado, encerro por aqui meus comentários, pois me parece óbvio que temos pontos de vista diferentes. Mas respeito sua opinião, a qual procuro compreender.

Quanto ao livro “O fim de uma era” fui um dos primeiros a adquiri-lo, lá na Catedral, pois ainda nem estava nas livrarias evangélicas. E aproveito para lhe parabenizar pelas excelentes perguntas, que fizeram do livro uma leitura tão interessante que já o li por duas vezes. E recomendo a todos!

Espero não ser mal compreendido em meu comentário. Esse é um assunto por demais delicado, que não pode ser tratado em poucas linhas.

No amor de Cristo
Alan Capriles


Mauricio Zágari disse:
02/10/2011 às 0:27
Querido Pr Alan,
Não precisa agradecer pela publicação de seu comentário e por minha atenção ao respondê-lo, o dialogo é bom e saudável. E feito como fazemos, com educação, respeito e amor cristão, eu devoto a isso o tempo que for necessário. Pelo menos o senhor não me chamou de “bundão”, como o pastor-mor dos desigrejados no Brasil trata aqueles que se mantém no modelo do qual ele apostatou nem de “fariseu”, como já fui chamado pelas costas por desigrejados que não aceitam minha visão. Então dialogar com alguém com o seu nível de educação para mim é um bálsamo, mesmo que haja divergências. Sobre suas observações, vamos por partes.
 Sobre nem todos os desigrejados serem pessoas “que não tiveram a capacidade de compreender a realidade da congregação dos santos”, eu creio que a resposta que dei ao comentário da irmã Regina em outro post expõe minha visão sobre isso. Creio que é pertinente reproduzir aqui um trecho da conversa que tive com ela. Regina faz a seguinte colocação {Entre chaves}:
 {A vida na Igreja tem sido muito mais uma extensão do mundo que um lugar de refrigério e comunhão. Aquele que está cansado das difíceis relações no trabalho, em casa etc, que se sente muitas vezes assediado por um chefe, colega, ou que tem lá seus tormentos familiares, quer muito encontrar na Igreja um lugar para descansar o espírito, convivendo em alguma sanidade e santidade, buscando alimento mesmo, físico, psíquico e espiritual. Não que a pessoa queira viver na caverna retratada aqui pelo outro Maurício, mas creio que o que ela deseja, precisa, clama é pelo mundo que está fora da caverna, cheio de sol, brilho, frescor, restauro, mas dentro da Igreja. E não acha, porque na comunidade as relações de fora se repetem. Ouvi ontem uma pessoa comentando que os favoritismos, protecionismos, da estrutura que existe no seu trabalho a semana inteira, ele tem que “aturar”(e só o Espírito o fortalece!) na igreja. O que não pode pra geral, pode para os mais achegados, os amigos; citando um exemplo dado por ele, ser ouvinte numa classe de EBD não pode, mas pode para um amigo do professor etc e tal. Essas coisas são perceptíveis e para muita gente ‘pega’, desanima. Aí, como ele arrematou no papo, dá mesmo é vontade de ir refrigerar na praia, olhando a natureza e mergulhando no mar de Deus…}
 Ao que eu respondi o que reproduzo aqui abaixo na integra, entre colchetes:
 [Querida, o equivoco desse discurso é que igreja não é resort.
As pessoas que se afastam da igreja achando que ali teria de ser apenas um local de alivio e refrigério não entendem a função da igreja.
Essa é apenas uma de suas funções. Mas igreja é, muito mais do que isso, local de se doar. De emprestar os ouvidos pro que sofre. De orar pelos enfermos. De chorar pelos pecados cometidos e se arrepender. De comungar na Ceia. De aprender que o ser humano não é perfeito. De ouvir pela pregação que somos miseráveis pecadores e em vez de se conformar com isso e jogar nas costas da graça de Deus a explicação e a justificativa, ajoelhar-se clamando por misericórdia e se esforçar por mudar. E por aí vai.
A Igreja, de forma inédita na Historia, está conformada com seus pecados. Acha que ir ao santuário é como tomar uma sauna pra ter um “relax” das tensões do dia a dia. Nada mais errado. Ali somos confrontados com nossa pecaminosidade. Muitas vezes Deus conduz o pregador a nos chamar ao arrependimento e não ao alivio. Às vezes a igreja precisa de contrição e não de cafuné. E aí o que vai ali em busca do suco com brisa fresca vai sair chateado. Pois não entende o que é a igreja.
O desigrejar-se é um erro grave. É fugir dos problemas (como se nas comunidades alternativas esses não existissem – esperemos um pouco e verão que os mesmíssimos problemas vão surgir). Não é solução pra nada. Se uma igreja comete erros insuportáveis, que se busque outra. Mas debandar em vez de ficar e ajudar a resolver os males, me perdoe, é um ato de covardia. Feridos de guerra são tratados e depois de curados voltam ao campo de batalha. O problema é que muitos não querem voltar para não ter de encarar aa dificuldades do bom combate. E, por isso, tornam-se desertores. Que acham que a batalha nao vai chegar até suas “comunidades”. Tenho pena, pois é uma visão ingênua.]
 Agora, Pr Alan, vc tem razão, há outros casos. Conheço o caso de um irmão – muito piedoso, por sinal – que liderava um grupo pequeno na sua igreja local. Certo dia o pastor resolveu acabar com os grupos e esse irmão, inconformado, abandonou a igreja e foi fundar sua “desigreja” na sua casa. E aí? Uma boa motivação? Ele saiu pq foi ferido ou coisa do gênero? Tudo me indica que foi mais por vaidade humana.
 E me permita discordar, Pastor, mas o que eu digo não é preconceituoso. É fruto de conversas e convivência com desigrejados, de ouvir seus argumentos. Não há preconceitos, há conceitos bem alicerçados. Para mim, o desigrejar-se é um erro grave e um caminho que não resolve os problemas.
 Sobre só haver uma igreja numa região, há montes de soluções. Algumas incluem esforço pessoal. John Wesley passava três dias cavalgando na neve para chegar ate certas comunidades e pregar o Evangelho. Mas muitos só querem o fácil. Meu irmão de sangue se converteu e foi morar na Espanha, um pais com menos de 1% de evangélicos. Não achava igreja perto da cidade em que vive. O que fez? Solicitou a uma missão das Assembléias de Deus que enviasse missionários. Mandaram um vocacionado…da Suécia!. Hoje a igreja tem mais de 70 membros. Meu irmão seguiu o caminho trabalhoso, mas que rendeu frutos.
A outra saída seria ele desigrejar-se?
 A igreja em que me converti plantou 18 congregações, todas em favelas. E é uma Assembleia de Deus de membresia extremamente humilde. E muitos carentes são abençoados por esse esforço de plantação de igrejas. A multiplicação das boas igrejas mediante o discipulado correto e a preparação e o envio de pessoas vocacionadas é um excelente caminho. É o que foi feito nessa igreja, por exemplo. É o que deve ser feito.
 O irmão colocou: “Quanto aos desigrejados detestarem a instituição e serem contra liturgias, hierarquias e o dizimo bíblico, a questão é: Por que detestam a instituição?” ——- Eu responderia de forma sistêmica, com base em fatos: porque a instituição aplica o que a Bíblia diz sem relativizar. É firme em suas convicções bíblicas. Duas desigrejadas que conheço se divorciaram sem ser por adultério e queriam se recasar. Os pastores das suas igrejas disseram a elas o que é bíblico: que tais recasamentos não têm aprovação do Evangelho. Elas se revoltaram e saíram da igreja, acusando a instituição, o “biblicismo” e a “falta de amor”. E aí? O erro foi do Pastor? Ou da concupiscência delas? Acredite: tentei dialogar com muitos desigrejados, mas ou não querem ouvir ou repetem argumentos espúrios que ouviram de pastores desviados que pregam absurdos na internet, como que nós somos “os da religião” e eles “os da graça” e outras bobagens do gênero. Ou seja, usam o recurso do ad hominem porque seus argumentos não têm base sólida.
 Sobre “a verdade, comprovada historicamente, é que essas coisas que os desigrejados combatem (igreja-instituição, liturgias, hierarquias e até o dízimo) começaram a entrar na igreja a partir do imperador Constantino, em 327 d.C. que passou a romanizá-la”. —– aí depende do que o irmão chama de “instituição”. Pelo dicionário, é “grupo organizado”. A Igreja de Atos diante disso me soa bem institucional. Pq em sua origem, uma igreja institucional é uma igreja com organização, distribuição de tarefas, horários, sede própria etc. Nada mais é do que isso. Pois bem, a implementação dos diáconos não foi um traço institucional? A figura do bispo, como Clemente, é do século I. As reuniões na Igreja primitiva seguiam SIM liturgias, como o partir do pão, o pregar da Palavra e a leitura das cartas. Eu visitei as catacumbas de San Calixto em Roma e vi locais onde isso era feito, liturgicamente, no século II. Então perdão, Pastor, mas a institucionalização da fé, as liturgias etc são anteriores ate mesmo ao Concilio de Nicéia, em 325 d,C e a 313 d.C, quando se liberou o culto cristão.
 E não nos esqueçamos: os cultos eram feitos em lares pela única e exclusiva razão de que eram proibidos pelo Império. Era mais fácil simular uma visita social à casa de alguém e ali cultuar Deus – liturgicamente, diga-se – do que fazer isso em praça pública, o que lhes garantiria passe livre para o Coliseu. Então historicamente a institucionalização de cargos, liturgias etc é bem anterior a Constantino, que apenas tornou público e trouxe para o poder o que já era feito. Ou o irmão acha que as liturgias dos cultos que passaram a ser feitos nas primeiras basílicas e nos primeiros templos cristãos “oficiais” foram inventadas naquele momento? Simplesmente transpuseram o que já era feito nos lares para os santuários. Depois começou a poluição que nós bem sabemos, mas aí já é outra discussão.
 E lembremos que a própria Ceia como Jesus a celebrou e mandou que repetíssemos foi de forma extremamente litúrgica.
 Sobre “precisamos admitir que a igreja viveu muito bem por quase três séculos sem ela. Teve muitos problemas? Teve, mas não mais do que atualmente”. — hmmmm… não é bem assim. Pense no que motivou os autores do NT a escrever suas cartas. Havia problemas hediondos no seio da Igreja: discriminação por classes sociais, sexo entre parentes, gente que ia tomar a Ceia para jantar, dons espirituais usados descontroladamente, roubos como os de Ananias e Safira, desunião, Paulo e Pedro se repreendendo na cara, heresias aos montes (como o gnosticismo, que levou João a escrever suas epístolas), abandono no primeiro amor, seguidores de falsas doutrinas (como os crentes de Pérgamo), imoralidade sexual (como a igreja em Tiatira), obras imperfeitas diante de Deus (como os cristãos de Sardes), cristãos que praticavam atos que fazia a igreja ser chamada por Deus de “miserável, digno de compaixão, pobre, cego, e que está nu” (como a comunidade de Laodiceia)….. Será que os problemas eram menores? Ou só diferentes?
 Sobre “os problemas de hoje são piores, tendo em vista que os cristãos daquela época eram reconhecidos pelo amor ao próximo e por darem a própria vida por amor ao Senhor” —– em muitos países onde há perseguição religiosa não é exatamente o que ocorre? A liberdade que há no Brasil é exceção e não podemos tomá-la por padrão para a Igreja de Cristo espalhada pelo mundo. Entre no site da Missão Portas Abertas e veja o que ocorre pelo mundo.
 Sobre “tem sobrado orgulho denominacional, soberba nos pastores, disputas por cargos e lideranças, investimento em mega templos, etc.” —- concordo. Mas não em todas igrejas.
 Sobre ” liturgias, hierarquias e até o dízimo bíblico nunca foram ensinados nas epístolas” —— não é fato. Atos já mostra isso: separação por atribuições (veja o diaconato), o episcopado ( 1 Timóteo 3:2 – É necessário, portanto, que o bispo seja irrepreensível, esposo de uma só mulher, temperante, sóbrio, modesto, hospitaleiro, apto para ensinar) e (Tito 1:7 – Porque é indispensável que o bispo seja irrepreensível como despenseiro de Deus, não arrogante, não irascível, não dado ao vinho, nem violento, nem cobiçoso de torpe ganância;). E me perdoe, mas dizer que isso eram apenas “funções” e não ” cargos” é mera semântica: “cargo” pelo dicionário significa “Incumbência, responsabilidade”. Não era exatamente isso o que os diáconos tinham, a incumbência e a responsabilidade de servir os irmãos? E os bispos, também não? Novamente no dicionário vemos que “função” significa “exercício de atribuições”. Para mim, isso é exatamente a mesma coisa. Então separar cargo de função, Pastor, é semântica sem distinção. Sim, havia cargos na Igreja primitiva.
 Quanto ao dizimo, são palavras do próprio Jesus: Mateus 23:23 – “Ai de vós, escribas e fariseus, hipócritas, porque dais o dízimo da hortelã, do endro e do cominho e tendes negligenciado os preceitos mais importantes da Lei: a justiça, a misericórdia e a fé; devíeis, porém, fazer estas coisas, sem omitir aquelas!”. Sem omitir aquelas significa o quê, amado? E o argumento de que o dizimo não era em dinheiro, antes que seja levantado, não procede. A Lei previa que os que vinham de longe poderiam trazer em dinheiro ao templos seus dízimos. Repare que Deuteronômio 14:22,24,25 deixa muito claro que se Jerusalém fosse longe da vila onde morava o dizimista, o transporte de suas colheitas poderia ser um problema. Assim, Deus permitiu que essas pessoas entregassem o dízimo em dinheiro. Transcrevo aqui: “Certamente darás os dízimos de todo o fruto da tua semente, que cada ano se recolher do campo. E quando o caminho te for tão comprido que os não possas levar, por estar longe de ti o lugar que escolher o Senhor teu Deus para ali pôr o seu nome, quando o Senhor teu Deus te tiver abençoado; então vende-os, e ata o dinheiro na tua mão, e vai ao lugar que escolher o Senhor teu Deus”.
 Sobre hierarquias serem inválidas “pois somos todos iguais abaixo de Deus” —— cargos e tarefas não desqualificam pessoas. Ou a Biblia não diz que foi o próprio Deus quem instituiu toda autoridade que há debaixo do Céu? E autoridade não fala de hierarquia? Tt 3.1a – “Lembre a todos que se sujeitem aos governantes e às autoridades, sejam obedientes”. Ou Hb 13.17 – “Obedeçam aos seus líderes e submetam-se à autoridade deles. Eles cuidam de vocês como quem deve prestar contas. Obedeçam-lhes, para que o trabalho deles seja uma alegria e não um peso, pois isso não seria proveitoso para vocês”. Ou ainda: 1 Pe 2.13a – “Por causa do Senhor, sujeitem-se a toda autoridade constituída entre os homens”. Se há autoridades, Pastor, há hierarquia. Voltemos ao dicionário: Hierarquia = “Subordinação de certos poderes uns aos outros; classificação ou ordenação segundo determinados critérios; organização segundo vários graus de poder e subordinação; e… grau de autoridade”. Para mim isso é claríssimo. Deus instituiu autoridade entre os homens, logo, há hierarquias. O que não é nada demoníaco, como tentam pintar, é algo estabelecido por Deus, para o bem da Igreja. Afinal, em Apocalipse a quem são enviadas as cartas das 7 igrejas?
 Sabe o que o dicionário aponta como o contrário de hierarquia? “Anarquia; desorganização”. É isso o que queremos para o Corpo? Abolindo as hierarquias nas “comunidades” dos desigrejados (o que é uma utopia, sempre há alguém que coordena, organiza ou algo assim [que é a autoridade], a quem eles dão o título semanticamente elegante de “irmão mais experiente na fé”) será que a anarquia não é o próximo passo?
 Sobre “Por favor, não pense que estou querendo lhe ensinar alguma coisa, sei que o irmão é professor de teologia e sabe muito bem de tudo isso.” —– fique tranquilo. O dialogo é importante e qdo feito com respeito e amor, como estamos fazendo, só traz edificação. Não me incomodo. E não leciono mais Teologia, logo, o título (ou cargo, ou função ou o nome que se queira dar ) de “professor de teologia” não me cabe mais, a bem da verdade.
 Sobre o dízimo já expus meus argumentos.
 Sobre a necessidade da instituição, eu a julgo fundamental, sem a qual nos espera o caos, a anarquia, a desorganização, a perda das amarras que nos prendem ao porto seguro da sã doutrina.
 E, pelo que escrevi acima e todos os posts que já escrevi no blog sobre a questão dos desigrejados, reafirmo minha convicção de que os desigrejados como pessoas “que não tiveram a capacidade de compreender a realidade da congregação dos santos”. Mantenho minha postura, claramente explicitada na resposta a Regina, acima. Entendo que o caminho que estão seguindo é equivocado e não trará nenhum benefício.
 Também respeito sua opinião, pois a opiniões todos temos direitos. Mas nunca desvio o olhar da Bíblia e da Historia. Elas valem bem mais do que minha opinião pessoal.
 Sobre “Quanto ao livro “O fim de uma era” fui um dos primeiros a adquiri-lo, lá na Catedral, pois ainda nem estava nas livrarias evangélicas. E aproveito para lhe parabenizar pelas excelentes perguntas, que fizeram do livro uma leitura tão interessante que já o li por duas vezes. E recomendo a todos!” ——– agradeço em meu nome e sei que Bp Walter ficará feliz.
 Sobre “Espero não ser mal compreendido em meu comentário. Esse é um assunto por demais delicado, que não pode ser tratado em poucas linhas.”. —– de forma alguma. Pastor, entendo sua preocupação com as almas, que é a mesma que a minha. Temos visões diferentes, mas tratamos um ao outro com afeto e respeito, seguindo o exemplo de Cristo. Isso é o mais importante.
 Já lidei com desigrejados muito ofensivos. Seguem o exemplo do “papa” deles, que chama pastores sérios de “bundões”, algo incompreensível biblicamente. Um desigrejado que me seguia no twitter tem tanto ódio de eu discordar dele que me deu unfollow e em todas as pessoas que me seguiam, para não ter que ver RTs de tuites meus. Foi isso o que Jesus ensinou? Qdo publiquei o post “O pecado supremo na Igreja evangélica: pensar” levei dois unfollows de desigrejadas e uma terceira, que nem me seguia, veio discutir comigo e me chamou de “fariseu” pelas costas. Esse é o espírito que vem seguindo os desigrejados, querido: revolta sem diálogos. Só ataques, ataques e ataques. Muitos bem ofensivos e agressivos, o que para mim é um sintoma de algo bastante grave em se tratando de fé cristã.
 Conheço desigrejados que me respeitam e me tratam com carinho, apesar das divergências de ideias. Mas em minha experiência pessoal, são minoria.
 Na paz e no amor de Cristo, que nos une,
MZágari


Alan Capriles disse:
03/10/2011 às 17:28

Querido irmão
Eu estava preparando uma longa resposta para seu comentário ao meu segundo comentário. Na verdade, já estava quase concluindo minha tréplica. Mas, de repente, tive uma súbita percepção de que isso não importa – nem a minha, nem a sua opinião.

Amamos ao Senhor? Sim, amamos. Tanto você, quanto eu. Por que gastar nosso tempo discutindo opiniões? Que nos esforcemos em vivenciar esse amor que temos por Jesus, no amor ao nosso semelhante. O resto não importa, simplesmente não importa. 

Sei que muitos leitores poderão interpretar isso como uma desculpa, mas Deus sabe que não é o caso. Nosso debate não nos levará a lugar algum. Nunca vi alguém reconhecer seu erro publicamente num debate e duvido que isso aconteça algum dia.

O que importa é a fé que atua pelo amor, o que importa é sermos uma nova criatura em Cristo Jesus. É isso que realmente importa.
(Mt 25:31-46; Gl 5:6; 6:15; Tt 3:14; 1Jo 4:20-21)

Nos laços fraternos desse amor,
Alan Capriles

01 outubro 2011

DISCÍPULOS DE CRISTO OU DISCÍPULOS DE CRISTIANISMO?


Por Alan Capriles

Vamos falar francamente. Qualquer pessoa que leia o Novo Testamento com o mínimo de discernimento perceberá o abismo existente entre o que Cristo ensinou e o nosso modelo de cristianismo. Não é necessário ser um teólogo para se perceber isso. Qualquer cristão sincero não somente o percebe, mas experimenta certa angústia mediante aquilo em que se transformou a igreja, tanto católica, quanto evangélica. Aliás, não vejo mais muita diferença entre uma e outra.

A verdade é que o “fermento dos fariseus”, acerca do qual Jesus nos alertou, tem contaminado de tal forma a cristandade, que precisamos nos perguntar se somos discípulos de Cristo, ou discípulos do cristianismo que inventamos. Por exemplo, se você ficou irritado com a afirmação de que não há muita diferença entre a igreja católica e a igreja evangélica, com certeza você está sendo mais discípulo de cristianismo do que discípulo de Cristo. Se não, vejamos:

Discípulos de cristianismo se esforçam por defender as doutrinas de sua denominação cristã, até mesmo com ofensas e injúrias contra seus irmãos.
Discípulos de Cristo preferem se esforçar na prática daquilo que Jesus ensinou, sobretudo em amar ao próximo como ele nos amou, tratando seu semelhante da mesma forma como gostariam de ser tratados.

Discípulos de cristianismo se sacrificam pela construção de belas edificações, nas quais o destaque maior será o nome de sua rica denominação, ou a foto de seu carismático e soberbo líder.
Discípulos de Cristo preferem se sacrificar na edificação de vidas, a fim de que cada um seja santuário do Espírito Santo e tenha o amor de Deus liderando seu coração.

Discípulos de cristianismo almejam títulos, cargos e as posições de liderança em suas denominações.
Discípulos de Cristo preferem o anonimato de quem veio para servir e não para ser servido.

Discípulos de cristianismo amam receber aplausos e o lugar de destaque sobre os demais irmãos.
Discípulos de Cristo preferem transferir toda a glória para Deus, a quem amam sobre todas as coisas e até mais do que a si mesmos.

Discípulos de cristianismo chamam de “casa de Deus” a edificação na qual se reúnem semanalmente.
Discípulos de Cristo compreendem que Deus não habita em templos feitos por mãos de homens, e que a verdadeira casa de Deus é uma edificação de pedras vivas, que são pessoas regeneradas e fundamentadas no senhorio de Cristo.

Discípulos de cristianismo se dedicam a ensaios, apresentações, festivais e congressos, a fim de dizer que estão fazendo a obra de Deus.
Discípulos de Cristo compreendem que a obra de Deus é esta: expandir o seu reino em todo tempo e por toda a parte, por meio da fé que atua pelo amor.

Discípulos de cristianismo gostam mais de ler e ensinar o Antigo Testamento, pois nele encontram versículos que respaldam seus próprios interesses.
Discípulos de Cristo preferem meditar nos evangelhos, nos quais desaparecem os nossos interesses, ofuscados pela graça e verdade que emanam de Jesus.

Discípulos de cristianismo cuidam de criticar e desprezar os que caíram no engano do pecado.
Discípulos de Cristo se concentram em ser misericordiosos, na feitura do bem por aqueles que precisam de cuidado.

Discípulos de cristianismo só conseguem ver como irmãos aqueles que concordam com suas doutrinas.
Discípulos de Cristo sabem que, por mais perdido e distante que alguém esteja do Pai, nem por isso deixou de ser seu irmão, a quem deve ajudar a reviver e reencontrar a paz com Deus, por meio de Cristo Jesus.

Discípulos de cristianismo idolatram homens, especialmente os líderes de suas denominações, aos quais imitam até nos gestos e maneira de falar.
Discípulos de Cristo percebem que abaixo de Deus somos todos iguais e que a ninguém devemos imitar, senão a Jesus, que nos ensina a simplicidade de sermos nós mesmos.

Discípulos de cristianismo se orgulham de sua tradição religiosa e a defendem cegamente, mesmo que seja contrária aos ensinamentos de Jesus.
Discípulos de Cristo não se orgulham de coisa alguma, a não ser na cruz do seu Senhor, pela qual estão mortos para o mundo, a fim de viver a verdade em amor.

E, finalmente,
Discípulos de cristianismo só conseguem ver a igreja como uma organização; mas
Discípulos de Cristo sabem que a verdadeira igreja é um organismo vivo, que sobrevive tanto dentro quanto fora dos meandros de uma instituição.

Mediante tamanha disparidade, precisamos nos questionar se somos realmente discípulos de Cristo, ou discípulos desse cristianismo que inventamos.

Por favor, não me interprete mal. Não estou me referindo a uma simples mudança de congregação, ou de religião. Não é nada disso! Também não se trata de atacar ou defender "a", "b" ou "c". A questão aqui abordada nos fala de mudança interior, ou seja, de se atacar a raiz desse problema: a hipocrisia que há em nós. Do contrário, fica impossível seguir a Cristo, seja lá onde for.

Portanto, não estarei orando para que você deixe de se reunir com seus irmãos em Cristo, seja qual for sua congregação. Ao invés disso, minha oração é para que não nos assemelhemos mais a esse cristianismo hipócrita que aqui foi denunciado, mas que saiamos de nossas trincheiras teológicas a fim de sermos um em Cristo, frutificando em amor, e somente para glória de Deus.

Alan Capriles