LONGE DEMAIS PARA VOLTAR ATRÁS

Por Alan Capriles
“A aventura pode ser louca,
mas o aventureiro tem que ser lúcido.”
(Gilbert Chesterton)

Aos dezenove anos de idade arrisquei-me numa das maiores aventuras da minha vida: viajar de São Paulo para o Rio de Janeiro pedindo carona na estrada. Uma experiência incrível e inesquecível, na qual aprendi muito, especialmente uma grande lição, que agora compartilho com você.

Eu trabalhava na capital paulista e queria aproveitar o longo feriado de Páscoa para rever meus pais e amigos no Rio. Mas o pagamento havia atrasado e não havia outra forma de viajar a não ser pedindo dinheiro emprestado, ou pedindo carona na estrada. Influenciado pela leitura do livro On The Road, de Jack Kerouac, optei pela aventura.

A primeira carona foi fácil. Na noite anterior ao feriado aproveitei uma vaga no carro de um amigo que iria para Taubaté, onde fui convidado para dormir na casa dos pais dele. Aos primeiros raios de sol me aprontei, enchi meu cantil e coloquei a mochila nas costas. Os pais do meu amigo tentaram me convencer a continuar por lá, mas, resoluto, fui para a estrada, com o dedão em riste, a fim de tentar a sorte.

Para minha surpresa, não demorou muito e uma caminhonete parou. O motorista se inclinou sobre o banco do passageiro, abriu a porta e me disse estar indo para “Pinda”. Perguntei se aquele lugar ficava na direção do Rio de Janeiro. Diante de sua afirmativa, aceitei a carona, contente por tamanha sorte. O motorista não gostava de papo. Limitou-se a dizer: “É chão até o Rio, hein...” Mas a carona não durou muito. Logo descobri que a tal “Pinda” tratava-se de “Pindamonhangaba”, cidade a cerca de vinte quilômetros de Taubaté, meu ponto de partida.

Assim sendo, lá estava eu novamente na estrada, tentando a sorte de uma carona que me levasse mais longe. Após uma hora de tentativas frustrantes, decidi continuar insistindo, porém não mais parado. Fui caminhando pela beira do asfalto, em direção ao meu destino. Lembro de ter passado por um pedágio, um posto de gasolina e depois por uma placa na qual havia uma inscrição inacreditável: “Proibido pedir carona nas imediações do posto”! Tive que rir de minha falta de sorte. Já passava do meio dia. O calor era escaldante.

Após haver caminhado algumas horas eu já me perguntava se deveria desistir. Mas foi então que cheguei a um local onde havia um pátio com diversos caminhões estacionados. Os motoristas conversavam e comiam num bar, parecendo todos velhos amigos. Abordei alguns deles, os que achei mais simpáticos, perguntando se alguém poderia me ajudar com a sonhada carona para o Rio. Dois caminhoneiros pareceram amistosos e prometeram levar-me ao meu destino. Porém, disseram que ainda demorariam muito por ali, que eu deveria voltar para a estrada e continuar tentando, pois talvez conseguisse uma carona melhor.

Com minha esperança renovada, retomei a caminhada pela beirada do asfalto, agora com a certeza de que, caso ninguém parasse, aqueles caminhoneiros amistosos parariam, tão logo me avistassem. Eu estava tão certo disso que quase não pedia mais carona, limitando-me a olhar para trás quando ouvia um ronco forte de motor, pois poderia ser o caminhão dos meus novos amigos. Enquanto caminhava, contemplava o visual, que era magnífico, experimentando uma indescritível sensação de liberdade.

Após cerca de meia-hora hora avistei um caminhão semelhante ao que eles estavam. Parei, tentando visualizar seus ocupantes. Eram eles mesmos! Acenei com a mão, sorridente. Mas o caminhão, ao invés de reduzir, acelerou ainda mais e veio para o acostamento com violência, na minha direção, obrigando-me a pular para o meio do mato.

Cansado, banhado em suor, faminto, levantei-me com raiva de mim mesmo. Como eu poderia ser tão ingênuo a ponto de acreditar na honestidade de caminhoneiros que eu não conhecia? E como eu pude ser tão tolo a ponto de achar que alguém lúcido daria carona para um desconhecido na Via Dutra, a estrada que liga as duas cidades mais violentas do Brasil?

Atordoado com esses pensamentos, pensei em desistir e voltar para São Paulo. Quando eu já estava a ponto de atravessar para o outro lado da pista, avistei uma placa anunciando um restaurante cinco quilômetros à frente. Tratava-se do local de parada para os ônibus de viagem, onde os passageiros podiam comer alguma coisa. Eu mesmo conhecia bem aquele lugar. Por diversas vezes passara por ali na infância, em viagens do Rio para Campinas, onde moravam meus primos.

Tive então a ideia de tentar uma carona junto àquele restaurante. Não para o Rio, mas uma carona de volta a São Paulo, pois eu já decidira desistir dessa louca aventura. Após uma longa e cansativa caminhada, cheguei ao restaurante, chamado Tamborindegui e entrei no toalete para lavar-me do suor. Fiquei um bom tempo olhando para mim mesmo no espelho, enquanto pessoas entravam e saíam, apressadas, cada qual com seu destino. Invejei-as, desejando ter um assento confortável para sentar, numa condução que me levasse de volta para casa.

Assim que saí do toalete, notei um bonito mapa, desenhado em azulejo português, que estava na parede do restaurante. Do lado esquerdo do mapa, São Paulo, meu ponto de partida; do lado direito, o meu sonhado destino, Rio de Janeiro. E bem ao centro, aquele restaurante, localizado próximo a uma cidade chamada Roseira. Bem ao centro, entre Rio e São Paulo. Espere aí... Bem ao centro! Então eu já estava na metade do caminho!

Olhei novamente para aquele mapa. Na verdade, eu não conseguia tirar os olhos dele. Apesar de já se terem passado mais de vinte anos, ainda me lembro de suas cores azul e branca e de como ele brilhava, pintado naquele azulejo português. Sentia com se ele me dissesse alguma coisa. Sim, ele me dizia, repetidamente: “Você já foi longe demais para voltar atrás... Você já foi longe demais para voltar atrás... Você já foi longe demais...”

Então pensei: se a distância para voltar é praticamente a mesma se eu prosseguir, está decidido. Eu não vou voltar atrás! Sigo em frente!

Ajeitei a mochila nas costas, atravessei pelo saguão do restaurante, cruzei pelos ônibus estacionados e me detive no pátio do estacionamento, com a ideia de abordar os motoristas dos carros que partiam em direção ao Rio. Após ouvir desculpas de todo tipo, um sujeito a quem eu já havia abordado se aproximou de mim, perguntando se adiantaria alguma coisa se ele me deixasse em São João de Meriti, município da baixada fluminense. “Onde o senhor me deixar está bom”, respondi. Ele olhou para o amigo que estava no assento do carona e depois apontou para a traseira do seu furgão. “Então, entre aí!” Havia também uma criança com eles, o que me deu mais confiança. Pensei: "Eles não me matariam na frente de uma criança..."

Tive que me espremer entre sacos pretos enormes, que não procurei saber o que continham. Entre a cabine e a parte traseira, onde eu estava, havia um vidro que impedia nossa comunicação. Foi melhor pra mim, porque pude dormir um pouco. Apesar do desconforto, o cansaço era maior. Por volta das dezesseis horas chegamos à descida da Serra das Araras, onde eles pararam e me ofereceram um caldo de cana, que tomei com enorme prazer. Percebi que o garoto que estava com eles olhava pra mim com admiração, como se eu fosse um personagem de filme, ou coisa parecida.

Ali ficou decidido que eles me deixariam na Avenida Brasil, de onde eu poderia pegar um ônibus para o centro do Rio, com o pouco dinheiro que eu carregava. E assim foi feito.

Lembro que o grande relógio da Central do Brasil marcava exatamente dezoito horas quando ali cheguei. Logo a seguir, o metrô me levaria para Botafogo, bairro onde morava meu pai, que custou a crer em tamanha loucura. Mas eu havia chegado, são e salvo, e era isso que importava!

Hoje, ao reler o caderno onde escrevi estas memórias, uma frase revela o quanto eu estava “duro” naquela viajem: “Só restaram dez cruzeiros e alguns centavos na minha carteira.” E, logo abaixo, uma data: 28 de Abril de 1990.

Após todos estes anos, compartilho com meus amigos não somente essa aventura, mas a maior lição que ela me deixou, revelada nos desenhos de um velho mapa:

“Você já foi longe demais para voltar atrás.”

Por muitas vezes, diante dos maiores desafios da vida, torno a me lembrar daquele mapa e de sua mensagem, que continua ecoando em meu coração: “Você já foi longe demais para voltar atrás... Você já foi longe demais para voltar atrás... Você já foi longe demais...” E decido então seguir em frente.

Alguns anos depois daquela aventura, descobri que as proporções daquele mapa não eram exatas, e que eu não estava na metade do caminho, mas a menos de um terço do trajeto! Mas isso já não importava... O mapa me fez crer que eu havia ido longe demais, que seria tolice desistir, e foi precisamente isso que me fez seguir em frente.

Mas, sabe de uma coisa? Pensando bem, aquele mapa estava certo. Ao longo da vida descobri que o caminho de qualquer desistência é sempre maior que a mais longa estrada, e não menos doloroso que a mais difícil conquista. Vale a pena prosseguir. Persevere! Você também já foi longe demais para voltar atrás.

Alan Capriles



Comentários

Unknown disse…
PR. ALAN CAPRILES,


A PAZ DO SENHOR GUERREIRO, QUE MENSAGEM EDIFICANTE! QUE EXPERIÊNCIA, CONFESSO QUE EM MEIO A LEITURA SE CONFUNDI COM O LIVRO "O PEREGRINO - UMA JORNADA PARA O CÉU", RSRS.

"GRANDES HOMENS SE FAZ COM GRANDES EXPERIÊNCIAS" JOÃO DÓREA

EM REALAÇÃO AO LIVRO ESTAREI ORANDO PELA SUA EMPREITADA, POIS ESTOU NO MESMO OBJETIVO, ESCREVO UM LIVRO "A NECESSIDADE DO SANGUE EO SEU DOADOR", PEÇO-TE AS TUAS ORAÇÕES.

QUE DEUS NOS ABENÇOE.
Alan Capriles disse…
Pr. João Dórea,

Alegra-me saber que minha experiência foi edificante para ti. Espero que outros irmãos também tenham a mesma paciência que o amado, de ler até o fim, pois a lição vem mesmo no final!

Apesar de eu estar muito longe de escrever como John Bunyan, confesso que me senti realmente um peregrino, enquanto fazia aquela viajem. E na verdade, somos todos peregrinos sobre a terra, a caminho da Jerusalém celestial.

Fico também feliz por saber que o amado está escrevendo um livro. Estaremos orando um pelo outro. Não esqueça de me convidar para a tarde de autógrafos, ok!

Um forte abraço, na paz do Senhor Jesus.

Deus abençoe cada dia mais sua vida e ministério!
Rô Moreira disse…
Muito bom Alan, me emocionei com sua experiência. Quando publicar não esqueça de me avisar, Deus te abençoe muito!
Paz querido!
Unknown disse…
Olá meu amigo Pr. Alan, Graça e Paz...
Longe demais para voltar atráz!

Determinarás tu alguma negócio, e ser-te-á firme, e a luz brilhará em teus caminhos. (Jó-22:28)."O alimento da fé, e a perseverança.
Parabéns, muito bom o seu esboço, conserteza o livro será exelente.
Gostei muito do estilo Max Lucado, ele também escreve as suas esperiencias de vida, isto é muito edificante.

Deus te ilumine e te abençoe....
Alan Capriles disse…
Querida irmã Rô,

Que bom você ter gostado. Sua opinião é importante pra mim. Se Deus me permitir lançar este livro, além de outro que está na frente (mas é teológico) com certeza você será uma das primeiras convidadas para a tarde de autógrafos!

Graça e paz!!!
Alan Capriles disse…
Amado presbítero Fábio,

Agradeço imensamente pelo incentivo! Conto com suas orações para que eu alcance meu intento. Estarei determinado e firmado, como no versículo de Jó 22:28, que vc me enviou.

Claro que estou longe de um Max Lucado, mas como nada é impossível para Deus, considerarei proféticas suas palavras!

Um forte abraço, amigo, na paz do Senhor Jesus!!!
René disse…
Alan,

Muito interessante esta sua história! Mais ainda, a mensagem que vem dela: prosseguir para o alvo, independentemente das circunstâncias! Todo aquele que se entrega ao senhorio de Jesus e que decide fazer a vontade de Deus, precisa ter este pensamento e nunca cair na tentação de voltar para o "Egito".

Conte com minhas orações, para que você alcance o objetivo de escrever e publicar o seu livro. E que isto seja para a honra e glória do Senhor!

Grande abraço e continue na Paz!
Anônimo disse…
Muito legal sua historia, sempre achei legal essas coisas, mas nos filmes tudo parece mais facil...
Enfim, assim é a vida... Vivendo e aprendendo cada dia mais!
Que Deus continue te abençoando mais e mais!

Amanda
Anônimo disse…
Tu era doido mesmo meu irmão kkkk. Quando sair o livro me avisa tá bom? Paz e bem
Alan Capriles disse…
Valeu pelo apoio, René!
Fico feliz que vc tenha entendido a grande lição desta história. Quem já experimentou o amor de Deus com certeza foi longe demais pra voltar atrás!
Graça e paz!
Alan Capriles disse…
Oi, Amanda!
É isso aí, precisamos tirar lições de tudo em nossa vida.
Espero ver seus comentários em outros artigos. São importantes pra mim.
Deus lhe abençoe cada dia mais!
Alan Capriles disse…
Mano Cláudio, vc tem toda razão: eu era doido mesmo!!! Mas o pior é que não sei se estou curado disso. Kkkkkk

Graça e paz!
Egrégio pastor Alan Capriles,
A promotoria pública conseguiu desentranhar o processo em que o amado pastor figura como réu.em ação que é acusado de ser um “egrégio” confrade deste seu irmão, conservo e seguidor. Lembra-se?
O Juiz dos juízes, o nosso Deus, através da nossa confradaria, a blogosfera cristã, criou um tribunal, não menos egrégio, nomeando editores de blogs e seguidores, como dativos. Todos estão vestindo togas espirituais, arvorados nAquele Supremo Magistrado que, na realidade, é a própria toga.
O amado pastor, bem como esta confradaria, está trazendo a julgamento, fatos incontroversos, mostrando, com clareza solar, que a matéria é de fato e de direito e, como tal, outras provas não serão acatadas para submissão a ilógicos questionamentos.
Esta sua excelente postagem, trazida ao processo, ofereceu a esse tribunal “ad quem” as condições suficientes para que o fulcro da questão fosse levado ao julgamento imediato do mérito.
Coube àquele tribunal proferir a sentença, com apreciação de mérito, extinguindo a ação de forma decisiva, antecipando-se a outra lide entre nós,
A prolação da sentença, de plano, acolheu o meu pedido, sem qualquer prejuízo das suas garantias ministeriais e espirituais – com base na sua magnífica postagem, as provas tornaram-se irrefutáveis.
Eis a sentença de mérito definitiva, apreciados relatos e fundamentações na postagem e a questão em lide:
Considerando que:
> a data da sua chegada ao Rio de Janeiro coincide com a data em que o autor da ação foi dado à luz (28.04) – Jesuscidência?
> há provas cabais de que o amado pastor é um escolhido capacitado pelo Senhor e não um daqueles muitos capacitados, não-escolhidos;
> aquele servo, em não apresentando (não permitiram) contestação tempestiva, tornou-se revel, aceitando como legítimo o conteúdo da petição;
> demonstra, em seus escritos, ter aversão à hipocrisia, um dos estereótipos de Bunnyan (O Peregrino);
> persevera em ser “amigo” de Deus, fazendo a Sua vontade e crendo no alcance das Suas promessas
> admite ter ido longe demais para voltar atrás:
Este tribunal condena o pastor Alan Capriles a aceitar a qualidade de “egrégio mestre” por ser detentor da nobreza suficiente para, assim, ser conclamado. Sua notória humildade não será validada como razão para que não se venha a ilustrar aquele insigne homem de Deus, um ungido do Magistrado Maior deste egrégio tribunal.
Aquele ministro do Evangelho está condenado, ainda, a escrever o livro em que estará narrando experiências vividas.
Entrementes, a confradaria se obriga a orar, permanentemente, pela conclusão da obra que aquele líder servidor estará obrigado a escrever para honra, glória e louvor do Juiz Supremo das nossas vidas.
Ele me mandou.
Seu conservo em Cristo
Rô Moreira disse…
Maravilhoso, este é o irmão Alberto. Paz!
Alan Capriles disse…
Rô, agradeço por seu breve e acertado comentário a respeito do nosso querido irmão Alberto.

Quando recebi o comentário dele, achei tão profundo que deixei para reler novamente depois, com mais calma - e com o dicionário do lado, Kkkk!

Mas confesso que acabei esquecendo e com isso cometi a deselegância de não agradecer a ele por tão longo e belo comentário.

Portanto, aproveito o ensejo para agradecer também ao irmão Alberto e fazer coro com sua definição a seu respeito:
Maravilhoso, este é o irmão Alberto.

Deus lhes abençoe cada dia mais!